segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Força Y

Por Pachá

Ligeira indecisão na vaga pro carro. Decide por posição mais exposta. Ao sair olha em volta e se convence que precisa trocar de carro, o seu completará ano e meio em breve. Olhou para seu pulso e o brasão nórdico de seu relógio lhe alegrou o momento deste dia e de muitos outros. Saiu do carro, ajeitou a camisa e pelo vidro da porta do carro o homenzinho no cavalinho estampando em seu peito, parecia lhe sorrir. Andou com seu costumeiro andar de homem arrojado, competitivo. Pensou que logo completaria trinta anos, e se alegrou ao saber que conquistaria mais do que seu pai na mesma idade. Sorriu para o porteiro um autômato cumprimento e adentrou os corredores da multinacional de equipamentos espaciais para computação analítica do cosmos, Holly Mountain. A caminho de seu pequeno e singelo feudo, um cubículo com 2 x 2, passa pela sala de seu gerente, dez anos mais velho que ele. Certo dissabor o preenche. - Esse cara já era um dinossauro mesmo antes d´eu nascer. Mas logo se esvazia quando o computador é ligado. Mergulha na resposta de e-mails. Orquestrados com sarcasmo e amenidades, conforme sua conveniência. Um e-mail lhe chamou a atenção, novo plano de carreira Y. – Ah mais já era tempo. Fragmentos de conversas do almoço vêm a sua mente, algo sobre um livro, raças gama, alfa qualquer coisa dessas sem importância, que alguns acham que tem alguma nobreza ou mesmo experiência. Abriu a revista eletrônica Sou mais EU S.A. verificou as dicas de livros; “Guia rápido de indumentarias de impactos para reuniões importantes”, “Seu Corpo fala, domine seus Conflitos apenas com olhares e expressões corporais persuasivas em dez lições”, “Técnicas Holísticas para observações probabilísticas da Curva de sucesso VS. Idade”. Seus olhos então ganham novo incremento de pixel quando vê o novo livro do autor indiano, com quádrupla nacionalidade BRIC, Otpeni Mobousue IesueNavegando em um céu azul de cisnes pretos. O mesmo do best-seller Criando Cisnes pretos sem Céu azul em Caos Profundo sem Fim. Processou compra, e aguardou pontuação. A sua vaga na palestra; Achando causas raízes ao Clique do Mouse, está  garantida. Consulta agenda, e se prepara pra primeira reunião do dia. E de reunião em reunião a manhã se esvaiu. Na hora do almoço concatena ideias com seus pares.

“E final de semana, hein?”
“Bom. Consegui instalar aparelhagem de som no carro, daquela loja indicada no sonzerão.com. br”
“Legal, também tive altas emoções, consegui zerar a versão 3.6.2.0.1.105 jogo online do site jogosdoexecutivomoderno.com. br”
“Vocês viram o perfil do Pedro Ricardo no conektin...su-rre-aaaal  ”
“E o nosso plano de carreira Y,  finalmente vai sair.”
“Pô ai, essa comida ta ruinzona, tipo assim sabe, comida sinistra de ruim.
“A Companhia Quasar Super Nova já possui isso a séculos”
“E os salários são mais atraentes. Acho que deveríamos fazer um approach

O resto do dia avança pela tarde como um exército Teutônico sob ataque prussiano, dissabores, inconformismo tudo adormece nessa hora, pra renascer tal qual linda e insana fênix logo que os olhos brilham na luz do dia seguinte. Mas a vida é feita de momentos, e na segurança de seu carro, ele divaga sob problemas universais; “como essas pessoas podem voltar para casa em ônibus lotados, quentes, em pé?”, bizarro!Concluiu enquanto calibra temperatura do ar e pouco lhe importa certos paradoxos; mais conhecimento e menos poder de julgamento, mais posses e poucos valores, correr contra o tempo e pouca paciência. Tudo que importa é a estigma do homem vencedor, bem sucedido absorto no materialismo que demonstre o quanto se é “bom”. O quanto é prazeroso fazer, ter, possuir simplesmente porque pode e que nada tem haver com necessidade, prioridade, impulsionado na ostentação da felicidade  de prazeres finitos.
Em casa os símbolos das suas conquistas o lembra do caminho, rejubila espírito, e as tragédias do noticiário, a situação política, não o abala, “o cabelo da apresentadora mudou, nice...“ Ele esta fazendo sua parte, contribuindo para o crescimento do país. Um novo dia escorrega pelas persianas de seu quarto, seu levantar é acompanhado de vontade inexplicável de vencer mais uma batalha dessa interminável guerra. No banho pensa no dia que virá. Em frente ao armário de roupas confere símbolos de conquistas. O homem do cavalinho continua sorrindo riso que nunca finda em comunhão com deboche do jovial jacaré. Ninguém lhe entende mas, ele é claro, objetivo. Pertence a outra classe, da geração Y, dofeedback, da meritocracia assistida do self made man high tech, plugado 24 horas por dia em abundância de dados, “sons e fúria” que pouco amadurece ou exercita a empatia. Suas metas são cristalinas, sua determinação é cega e esconde perguntas como; pra quê? Por quê? E a subjetividade fica por conta do vocabulário a ser usado na próxima reunião, no almoço, no chique botequim onde a beleza é estampada em sorrisos, tipo assim sabe, sei lá sabe!I, mas um príncipe não precisa ser príncipe, precisa apenas demonstrar que é. Que saibam todos que o tempo lhes pertence, que as pesquisas mostrem como deve ser o individuo de sucesso, e em cada parágrafo, comentário, uma imagem se formará, se materializará com o perfil de sua geração, que o mercado se dobre as suas vontades, que seu estilo se impregne de forma inexorável no DNA de cada organização ate não restar dúvida de que o tempo está a seu favor. E dirão; “mas era óbvio que sim, quem não apostou está pagando um preço alto, perdeu o time das estrelas”.
               
Então ele entra no carro, regula o ar, troca a música e submerge na felicidade de metal, vidro...


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