sábado, 17 de janeiro de 2015

MISCELÂNEA SEPTUAGENÁRIA: CONTOS E POEMAS


Por Pachá
Lançado em 1990, e só agora no Brasil, Septuagenarian Stew é um Bukowski cançado, se não pela idade, pela busca de energia em manter a pegada de uma escrita de afronta a vida e a morte. Não a toa ele divaga em contos e poemas sobre bloqueio de criatividade, morte e a difícil arte de ser escritor em tempo integral. Quatro anos depois ele viera a falecer. E em algumas passagens dessa reunião de contos e poemas, me parece que Bukowski encarou essa espécie de canto de morte do cisne, como um desafio, um recado para vida, morte e todos que segundo ele danificaram sua vida de alguma forma. A figura paterna, os críticos, os escritores sem culhões, a América entupida e desafiadora e a arte de sobreviver e persistir a cada queda, a cada recomeço.

Permeia nessas miscelâneas o processo criativo do "velho safadão", pois nem tudo é só garrafas, ressacas e sexo banal. Ele agradece a tecnologia por ter criado máquinas de escrever elétrica, mas também a nostalgia do passado de máquinas que emperravam teclas e de como era preciso ter leveza e precisão nos toques para evitar tal contratempo. Se regorjear com o presente após anos de sofrida luta, alcançar lugar seguro na sociedade. De sua BMW preta, pois caras durões dirigem BMW pretas.
Embora tenha grande familiaridade com a prosa dos contos de Bukowski, esse é meu primeiro contato com sua poesia e portanto apenas posso comentar por esse trabalho. Embora mais sóbrio e responsável que os contos, alguns poemas não tem compromisso com estilo boemio, cotidiano, mais lembrando preenchimento das horas no papel. Mas foi uma grata surpresa a leitura desses poemas septuagenários.

"Esta Profissão Tão delicada"

Você pode pensar sobre escrever
até que não consiga mais escrever,
a armadilha estrala
e você é pego entre
lugar nenhum e um tipo
de ar puro
o telefone toca e é
o editor:
"escute, garoto não tenho noticias suas..."
"não mandei nada pra você ultimamente?"
"não, nada de novo..."

"é apenas um branco, um tempo
de reorganização...
você entende, não acredito
em forçar a barra...
é a coisa mais destrutiva
que se pode fazer..."

"claro, garoto, claro..."

o escritor desce a
escada e se senta no
sofá com sua
mulher.

esta passando um filme sobre
Al Capone na
tevê.
o escritor sempre
foi fissurado por
filmes de
gângsteres.

o escritor assiste
ao filme
inteiro, diz para a
mulher: "esse era uma verdadeira bomba..."

"era ainda pior do que isso", sua mulher diz.

o escritor sobe
a escada, coloca a 
capa sobre a
máquina, vai até o quarto,
troca as roupas pelo pijama,
enfia-se na
cama
abre a National Equire
e começa a ler.

não devo pressionar,
o escritor pensa,
superação é o que
fode tudo...
não quero meus miolos
espalhados por toda a
parede como os do
Ernie...

quando a mulher do
escritor sobe a escada
30 minutos
depois
ela o
encontra
adormecido,
as luzes ainda
acesas,
o tabloide sensacionalista
aberto sobre seu
peito

ele esta salvo por
mais um
noite.


 
O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://cultura.estadao.com.br/noticias/literatura,em-livro-inedito-no-brasil-bukowski-esta-na-beira-do-precipicio,1570451O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://cultura.estadao.com.br/noticias/literatura,em-livro-inedito-no-brasil-bukowski-esta-na-beira-do-precipicio,1570451O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://cultura.estadao.com.br/noticias/literatura,em-livro-inedito-no-brasil-bukowski-esta-na-beira-do-precipicio,1570451

Nenhum comentário:

Postar um comentário