Por Pachá
Uma das coisas mais poderosa da linguagem do cinema, é a subversão do tempo, esta certo, a literatura também tem esse poder, mas diferente da literatura o cinema tem uma história determinada pelo tempo físico, o tempo de projeção, e por isso acredito que o tempo sofre uma verdadeira subversão, que se dá pelo corte.
Kaufman é conhecido pelos seus roteiros e filmes nada palatável, mas com intenso poder de reflexão a cerca do que estamos vendo na tela, se é fruto ou não de uma realidade e que realidade é essa, e na maioria de seus filmes há esse fluxo de consciência, da qual a literatura de kafka, James Joyce, Virginia Wolf, William Faulkner são os maiores precursores e diga-se de passagem os que melhor empregaram esse estilo. Estou pensando em acabar com tudo é uma adaptação do livro de mesmo titulo do escritor canadense, Iain Reid.
O filme abre com uma cena, um homem olhando pela janela uma jovem esperando alguém. Corta para jovem, Louise (Jessie Buckley) que entra no carro. O diálogo que se desenvolve entre a jovem e seu namorado, Jake (Jesse Plemons) é literal, longo e com bastante coerência quando percebemos que a jovem que dar um fim nesse relacionamento. E como se trata de Kaufman os detalhes são importantes, e aquela saliva acumulada no canto da boca de Jake e como ele limpa, não é apenas as coisas, essas pequenas coisas que passamos a detestar no parceiro(a) quando nos falta coragem ou dignidade para dar fim a algo que não tem o menor risco de dar certo. O diálogo ganha tons insólitos quando a jovem recita um poema, sobre a sensação de voltar pra casa "bonedog", isso causa em Jake uma imensa familiaridade. Isso é uma das pistas do roteiro. Porém tudo ganha ares de pesadelo, quase terror, quando o casal chega a casa dos pais de Jake, e a partir dai sabemos que se trata da reconstrução do passado ou memórias de alguém, Jake ou Louise?
Kaufman se utiliza muito bem do tempo psicológico, e se prestarmos atenção, há poucas cenas no presente, e são justamente do homem, que limpa uma escola, almoça, assisti a um seriado, e ao terminar seu turno vai para casa. E a cena mais emblemática é a do caminhão. A história de Kaufman se passa exatamente em um dia de trabalho até o momento em que ele termina seu turno, e dentro do caminhão, sofre alguma crise de demência ou Alzheimer e morre congelado.
Há vários indícios de que Jake sofre de alguma doença degenerativa de memória, ou interpretação da realidade, todas entregues nas cenas da casa, onde há um confronto entre vários passados desse homem, mas que também sugere certa confusão ao sermos induzido de que esse passado é de Louise, quando na verdade ela seria a mulher que Jake gostaria de apresentar aos pais, inteligente, bonita e com senso de humor. E assim como em um sonho, onde nos é permitido tudo que nos é negado enquanto acordado, Kaufman cria uma historia fragmentada mas com uma cronologia bem encadeada com total subversão do tempo.
As interpretações são muito bem conduzidas, Buckley leva muito bem a personagem, que inicialmente era de Brie Larson. Plemons mostra o quanto é versátil. O casal, pais de Jake, Collette e Thewlis dão um show a parte e em minha percepção roubam as cenas.
E mais uma vez Kaufman nos brinda com uma obra que dividirá opiniões, os que vão achar chato, e os que acharão genial.
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