terça-feira, 14 de julho de 2020

A Hora e a Vez de Augusto Matraga 1965

Por Pachá
Baseado no conto de mesmo título, e o último da coletânea Sagarana de 1946, Roberto Santos consegue imprimir o lirismo e tragédia a que está carregada a literatura de Guimarães Rosa. Os diálogos são verdadeiras poesias e consta que Guimarães Rosa considerou o final do roteiro de Roberto Santos e Gianfrancesco Guarnieri para o filme de 1965 bem mais interessante do que seu texto.

Augusto Matraga (Leonardo Villar) é um sujeito violento, seja com a família ou com vizinhos, não respeita filha moça, nem mulher casada. E como diz o ditado, nada se esquece mais rápido do que um favor, e nada tão lento como uma ofensa. E em um instante o mundo de Augusto vira de pernas pro ar, a mulher foge e leva a filha para casa de desafeto de Augusto, e como sertanejo aprumado na valentia e honra é coisa séria, toca pra buscar mulher e filha na fazendo do desafeto. É emboscado e tido como morto.

Assim como no conto, Santos consegue captar, mesmo com uma produção mediana, o cotidiano do sertanejo, as relações de poder entre o coronelismo, trabalhadores rural. Há uma cena, um leilão de quermesse, no qual se leiloa uma mulher, lembra a venda de esposas, tal qual se fazia na Inglaterra, bem pesquisada e documentada por Edward Thompson em "Costumes em Comum", mostrando como o colonialismo, modifica e transforma a cultura de povos colonizados.

A atuação de Villar é irretocável, seja no emprego do dialeto característico dos sertanejo, seja na expressão corporal, e em conjunto com a fotografia de Helio Silva com ângulos,  e movimentos, que para época, anos 60, devia ser bem inovador, com sequências externas de um primor só. A cena em que Augusto precisa domar o cavalo, mostra o domínio de técnica e estética. A trilha sonora, composta por Geraldo Vandré, é um elemento a parte, a primeira vez que assisti, ela me trazia uma tristeza sem mais nem porque, mas ao rever, só consegui ver a beleza, de uma terra de um povo e sua cultura simples, e de como o cinema tem o poder de criar essas imagens, belas e tristes.


Na I Semana do Cinema Brasileiro, em 1966, em Brasília, o filme levou os prêmios de melhor argumento, diálogo, direção e ator (Leonardo Villar). Em Cannes, em 1966, Roberto Santos foi indicado à Palma de Ouro por este filme.





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