sábado, 5 de setembro de 2020

Clash

 


Por Pachá

A estratégia que Mohamed Diab adotou para analisar as revoltas que tomaram contam das ruas do Egito em 2013, é inusitada e ao mesmo tempo de grande sagacidade. Seguido os eventos da primavera árabe, a população do Egito vai as ruas mais uma vez para reivindicar direitos políticos e sociais...

O lugar de fala de Diab é o interior de um camburão, no qual a policia vai colocando os manifestantes com intuito de "controlar" os levantes, e a partir desse, criar o microcosmo dos vários atores sociais desse movimento popular. Embora não há qualquer preocupação do diretor em explicar os motivos do levante, é sabido ou ao menos analisado pela história do tempo presente, de que dois fatores foram primordiais para esse movimento popular: primeiro pela quebra do contrato social que regulava as relações entre Estado e sociedade, no qual serviços básicos como saúde, educação e aumentos dos cargos públicos, moradia a preços acessíveis em troca de obediência, ou seja, trocando bem estar social por direitos políticos. E a partir dos anos 80 esse modelos se desgasta, o governo achou que já havia "conquistado"o povo e não via mais sentido em dar contrapartida alguma pela obediência política. Segundo foi a forma de repressão política que seguiu após a quebra desse contrato social, que até então era realizado com algum "controle" de capitães e coronéis, e ainda sim só ocorria prisões e torturas, quando havia suspeita de grupos politicamente organizados, mas a partir de 2010 isso mudou, e torturas e violência contra cidadãos pactos virou rotina, e numa dessas abordagens da polícia, o jovem de 20 anos, Khaled Said de família rica, foi brutalmente assasinado na calçada de um ciber café, e depois acusado de ser suspeito de armar grupos contra o governo, e esse fato foi o gatilho para o levante que derrubou Mubarak e colocou um membro da irmandade islâmica no poder, Mohamed Morsi, eleito democraticamente em 2012 e que se tornou impopular ao tomar ações contra os militares, levando em 2013 novamente o povo para as ruas.


O inicio, dois jornalistas são presos dentro de um camburão por suspeita de serem espiões, em seguida a policia vai colocando novos manifestantes, primeiro os que estão a favor dos militares e por ultimo membros da irmandade islâmica (pro governo), e está formado o caldeirão, no qual são todos contra todos, como uma espécie de amostra do que está acontecendo lá fora, nas ruas. 

Fiquei com a explicita sensação de que Diab tratou a questão política, com muito cuidado como se evitasse maiores debates a cerca dos motivos que levaram aos protestos, e em detrimento desta, buscou analisar a condição humana, de indivíduos que no fundo querem apenas tocar suas vidas, como o ator frustrado, o DJ que desempregado, uso esse chaveco só para se aproximar da irmã de seu melhor amigo. A mãe e pai que querem apenas que seu filho/filha cresça e se tornem bons cidadãos, etc. São sonhos, anseios e desejos que se choca com o momento político do país.

Nessa estratégia de analisar o macro pelo micro, a narrativa de Diab perde força, e cai em diálogos superficiais, e ai fica minha desconfiança de que o diretor evitou diálogos mais profundos, mas ainda sim nos prende aos acontecimentos no interior do camburão.

As atuação são convincentes e nos dão uma perspectiva dos conflitos dessa natureza, no qual a ira, fúria e insensatez até é parte inerente do processo. Um filme poderoso, bem filmado e com desfecho assustador.


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