quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Interstellar

Por Pachá
Nenhuma civilização conseguiu se desenvolver sem antes controlar suas pulsões de morte, esse instinto de criar e ao mesmo tempo de destruir. O homem como animal simbólico é o único capaz de morrer e/ou matar por uma ideia. É único capaz de criar armas de destruição em massa e viver atormentado por elas. O novo filme de Christopher Nolan parece partir deste ponto, da negligência dos seres humanos com a própria espécie, e da tentativa de criar esperanças, instintivas, de perpetuação da raça humana alimentado pelo espírito desbravador que fez com que o homem descobrisse mares, continentes, espaço, planetas e no processo devastasse seu habitat.

O mundo pós-industrial criando em interestelar é um mundo quase medievo, onde a principal preocupação é alimentação e homens para prover o sustento dos demais. Há escassez de alimentos, não se sabe como ou porque a humanidade chegou a esse ponto. A tecnologia e a ciência são apresentadas como devaneios danosos ao invés de provedora de soluções na transformação da natureza a favor do homem. O dialogo entre Cooper, (Matthew McConaughey) um ex-astronauta e engenheiro de formação, com a orientadora escolar, a cerca do comportamento da filha Murph (Mackenzie Foy) quando esta leva para sala de aula livro com a saga da chegada do homem a lua, deixa bem claro o embate entre ciência & tecnologia e o pragmatismo da sobrevivência. “Precisamos de bons fazendeiros, mais do que cientistas” é o parecer do diretor da escola que dá desfecho a conversa. Nesse ponto há de se atentar para possíveis contradições no roteiro, que diga-se de passagem é deveras complexo, quando vemos máquinas agrícolas operadas por GPS o que pode ser um discurso ambíguo ou talvez seja apenas delimitação das fronteiras tecnológicas. É certo, em minha percepção, que há intenso diálogo entre tecnologia e uso da mesma. Nada que não esteja dentro da ética cientifica e portanto motivo para acalorados debates entre os diversos setores da sociedade.

Nolan que certamente buscou inspiração em 2001 a odisseia, basta ver os robôs, mistura de monolito e Hall 9000, faz assim como Kubrick na memorável cena do osso que se transforma em nave espacial e demais sequências do avanço cognitivo do ser humano, uma transição convincente do homem, Cooper com pés no chão e anseios siderais até sua efetiva viagem interestelar com uso de “buracos de minhocas”.

O elenco também carrega seus méritos, não só pela ótima interpretação de Matthew McConaughey, como também na experiência de Caine presente na maioria dos filmes de Nolan. Anne Hathaway como apaixonada doutora Brand está correta. O diálogo entre objetividade e sentimento que seu personagem trava com Cooper é bem interessante, quando se trata de indivíduos com espírito e mente a serviço da ciência. Jessica Chastain como Murphy adulta fica um pouco distante da criança vivida por Mackenzie Foy, mas também não fere os eventos dramáticos. O também experiente John Lihtgow como Donald, sogro de Cooper mais que correto, é por ele que descobrimos muito do protagonista Cooper. E por fim, porém não sem importância, rostos conhecidos, Casey Aflleck, Wes Bentley.

A fotografia de Hoyte Van Hoytema nas cenas da Terra em processo de expurgo da vida humana, poderia ser um pouco mais árida, deteriorada em comunhão com clima de cataclismo anunciado nos diálogos dos personagens. Porém o filme certamente cairá nas graças dos fãs de sci-fi mais elaborados, muito mais que cenários futurísticos, naves exuberantes, até porque o futuro de Nolan para o planeta Terra é algo próximo, verossímil com desenrolar dos atuais eventos no habitat do homo sapiens.

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