segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Borgman

 

Por Pachá

"E eles desceram sob a terra para fortalecer sua classe"

Com essa citação Van Warmerdam abre o filme, achei se tratar de uma citação bíblica, mas não encontrei nada relacionando, mas ainda sim é possível, ao final do filme, ver que essa sentença é uma espécie de resumo do filme, um storyline poderosa, pois carrega certo sentido sobrenatural, maligno até. A cena que se segue, alguns homens se preparando para uma caçada, inclusive um padre, é tensa e também dá uma pista, um dos integrantes levam uma barra de ferro com ponta afiada.

Deus criou a família para ser unida, protegendo e fortalecendo cada membro. Uma família unida, guiada por Deus, é uma grande bênção! A bíblia prega que os laços de família são muito fortes. Em Teorema de Pasolini a família é desconstruída com a chegada de um estranho, e nada há de maligno e sim uma crítica ao capitalismo. Em Borgman o mal que se instala na família da artista plástica, Marina (Hadewych Minis) não é o mal dotado do maniqueísmo, mas o mal interno, intrínseco ao ser humano em sua pulsão de morte, uma vez que tudo está corrompido. Um mal surreal, a cena em que a garotinha que vê o homem ferido na floresta, ao invés de ajuda-lo, joga uma pesada pedra sob ele, é uma das pistas para entender o propósito de Camiel e sua trupe. A destruição do jardim, com as raizes de antigas árvores representa a ruptura e a destruição dos laços familiares.

Camiel (Jan Bijvoet) e sua trupe, executa um plano, do qual não há explicação, de maneira quase protocolar, burocrática, não há prazer ou qualquer regozijo em matar, manipular. Notem que nenhum dos integrantes dão um único sorriso em todo o filme, nem mesmo se entregam ao sexo, a cena de Pascal (Tom Dewispelaere) quando a babá das crianças se insinua para ele, chega a ser cômica, quando ele diz que esta cansado e quer apenas dormir. 

É estranho, e até incomodo a influência que Camiel cria sob Marina, a cena em que ele aparece sentado sob o corpo de Marina enquanto ela dorme, manipulando seus senhos, é aterrorizante, pois remete ao espirito maligno do pesadelo íncubo ou "alp"no folclore alemão. E a forma como ele vai desestabilizando a família é como um pesadelo acordado. E a tragédia anunciada e já prevista, ocorre, mas a maneira como Van Warmerdam, que faz o papel de  Ludwing, conduz a trama e o elenco, essa previsibilidade se transforma em um incomodo crescente a medida que mais perguntas vão surgindo e as respostas não aparecem para explicar o que está acontecendo.


Em minha percepção a cena inicial traz as maiores pistas. Vemos um cão preso, e dai é possível algumas suposições, o cão fica na coleira o tempo todo, não é solto para rastrear os perseguidos, sugerindo que o cão já é um dos prisioneiros, e recordando a fala de Camiel "fomos delatados" é possível que seja o cão. A presença de dois cães na casa quando Camiel já está quase no controle da família, também sugere que os cães sejam uma espécie de hospedeiros, ainda mais quando Camiel parece ter o poder de falar com eles. Eles se escondem debaixo do chão, e nisso pode-se concluir que eles bem podem ser uma espécie de vampiros. Camiel não invade a casa onde dorme a família, ele só entra quando é feito o convite de Marina para se recuperar da surra que levou de seu marido. Imediatamente veio a cena de Lost Boys a cabeça, um vampiro só entra em uma casa se convidado. A influência que Camiel exerce, emana da manipulação de extratos de ervas e química, para criar laços físicos e psicológicos e até envenenamento, pode ser um dos poderes desse vampiro alquimista holandês. A iniciação das crianças e da babá em uma espécie de bunker e cicatrizes cirúrgicas nas costas, permaneceram uma incógnita.

Borgman é um filme intrigante, pois ele quase mostra tudo, mas esse quase tudo, é na verdade, nada diante de tantas perguntas que ficam sem respostas, e a maneira com que o roteiro cria essas camadas onde se mostra muito e muito mais fica escondido é o grande mérito do filme, deixando a certeza de que um bom filme, eu digo isso sempre, não precisa fazer sentido, desde que eventos e imagens estejam bem encaixadas conferindo ritmo e provocações com sua veracidade interna.



Um comentário:

  1. Filme confuso sem pé nem cabeça. Minha nota: 2
    Apenas pela atuação dos artistas

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