terça-feira, 27 de agosto de 2019

Bacurau

Por Pachá
O novo filme de Kleber Mendonça, tem um poderoso poder de síntese em sua narrativa no que tange as questões politico culturais brasileira nessa onda conservadorista que assola o pais, e o mundo, diga-se de passagem.  

Aclamado com prêmio do júri em Cannes, creio que o mesmo não acontecerá com público, pois a narrativa arrastada, no primeiro ato em mostrar o estado das coisas, e a forma sutil como é tecido a critica política, pode afastar o público médio, ficando essa reflexão mais para um público cinéfilo engajado politicamente. 

A critica ou provocação, se dá logo na abertura, uma imagem do universo e créditos, tal qual acontece em Star Wars, e logo vemos o planeta Terra, deixando claro que a Terra, é redonda. E também para criar essa atmosfera de filme de ficção, já que a trama tem caráter distópico.

Em um outro momento acompanhamos um caminhão pipa chegando a Bacurau, no qual uma placa diz "Bacurau 17km, se for vá em paz", os símbolos de conotação com o momento politico parece estar em cada frame. Mas além do 17, essa placa também pode ter paralelo em Sertões de Euclides, "Todo nordestino é acima de tudo, um forte", o se for, vá em paz, se encaixa no ditado, "dou um boi para não entrar numa briga, e uma boiada para não sair dela".

A trama que tem múltiplos protagonistas, e creio que o mais relevante é o tecido social de Bacurau, ou seja, sua população, autogerida, sem policia, sem moralidade, apolítica que se esconde quando é necessário, vai sendo esmiuçada pela camera de Pedro Sotero, que alias tem parceria antiga com Kleber, é dele a fotografia de Som ao redor e Aquarius. E sem se aprofundar em um outro personagem, todos são superficiais, e nisso reside outra critica, se fizermos um paralelo a nossa atual administração politica, é possível associar certos personagens a certos ministros, politicos e grupos milicianos, mas isso é desenvolvido com nuances e sutilezas para que o espectador construa essa interpretação, e creio que nisso também reside certa falha do roteiro e uma certa pretensão ao se propor criar essa critica por vezes dúbia. 

Após situar o espectador dentro do estado das coisa, o filme ganha ritmo ao estilo Sam Peckinpah, faltou a câmera lenta, em referência ao Straw Dog, é possível fazer esse mesmo paralelo a Tarantino. E dai, entendemos o, "Se for, vá em Paz". 

No aspecto técnico o filme tem composição de fotografia com planos óbvios que não comungam com a narrativa distópica, e em alguns momentos, o filme tem uma metamorfose até interessante, que não sei se constava da ideia original ou foi consequência da montagem, lembra filmes B, a cena do drone chega a ser ingênua, ao lembrar Ed Wood e filmes do gênero, mesmo sabendo que é algo proposital, ainda sim cria certa atmosfera trash sem lastros, as transição wipe em estilo star wars me pareceu desnecessárias pelo mesmo motivo acima. mas se justifica pela estética adotadas pelo diretor. 

Na direção de arte, dois acessórios me chamaram atenção, o revolver COLT calibre .38 SPL usado pelo cyber punk Longa (Sivero Pereira), que era uma das armas adoradas pelo cangaço, Lampião certamente portava uma. E outra é o bacamarte, arma colonial que nunca foi usada pelos jagunços, nem em canudos, nem no cangaço, mas que no filme ganha a simbologia distópica steampunk, de idolatria as armas e de atraso também. E no moderno arsenal dos forasteiros, o avanço tecnológico, as atitudes etnocêntricas belicistas, com justificativas fúteis, xenófobas,homofóbicas. Cada linha dos diálogos em maior ou menor grau tentar passar essa idéia.


As interpretações não chamam atenção, mesmo os medalhões como Sonia Braga ou Udo Kier, mas nisso não reside nenhuma falha, já que a trama não está centrada em personagem específico, e sim pulverizada, em forasteiros e nativos, invasores e defensores, e já que existe um "ELES" é preciso haver um "NÓS" 

Confesso que entrei na sala de projeção com certa expectativa sobre o filme, até porque não gostei de Aquarius e esperava algo ao estilo de som ao redor, e sai sem essa expectativa atendida, mas ainda sim gostei do que vi. Resta saber se o filme, e sua proposta, vai resistir ao tempo e se firmar como, vêm dizendo ou rotulando, como o maior longa do gênero brasileiro





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