sábado, 28 de dezembro de 2019

Once Upon in time...In Hollywood


Por Pachá

A única coisa que podemos mudar do passado, é sua interpretação. Tarantino parece levar isso muito a sério, no sentido de subverter tal fato...e se...na História não existe se, esta subversão é própria das artes, e terreno fértil para o cinema. A premissa de Era Uma Vez é integralmente esta, captar a atmosfera da Hollywood dos anos 60 a partir do que ela foi e do que seria, se..., e não por acaso o recorte é este, Tarantino o escolhe por entender que esse período marca o ponto de transição entre a Hollywood dos filmes de caubóis, já em sua curva descendente, com orçamentos relativamente baixos, ancorados principalmente nas atuações de atores carismáticos, estes o chamariz para os filmes do gênero, as grandes produções de épicos, e também em declínio, E o cinema independente, feito por "fora" dos grandes estúdios, fruto do avanço da tecnologia que permitiu câmeras e gravadores de áudio menores, possibilitando filmes como Easy Rider 1969, dirigido por Denis Hooper, e isso assustava, pois ameaçava a hegemonia dos grandes estúdios. Esse desgaste das "fórmulas de Hollywood" permitiu a chegada de novos diretores, europeus, e o exemplo mais marcante, e não por acaso é de Roman Polanski.

A trama é conduzida pelos protagonistas; Rick Dalton (Leonardo Dicaprio) um ator em forte crise  criativa, marcado pelo descontinuado seriado "Bounty Law" que teme estar caindo no esquecimento, ao não conseguir mais papeis de sucesso. E Cliff Booth (Brad Pitt) um dublê de Rick Dalton em Bounty Law , igualmente em decadência, ou no esquecimento  que ficou marcado como assassino da esposa, e que se safou desse crime. Eles representam de alguma maneira essa Hollywood decadente que esta se recriando, se adaptando.

Não podemos esquecer, que a recriação dessa Los Angels dos anos 60, é fruto da memória afetiva do diretor, que ficou marcada nos passeios de carro , um karmann ghia, com seu padrasto, e não é a toa que Cliff possui um Kharmann ghia, e também as muitas cenas de carros pelas ruas com seus letreiros luminosos, restaurantes, cinemas. Há um video da revista Entertainment Weekly entrevistado Tarantino e elenco, que fala um pouco do que escrevo.

Na trama não há um grande mistério ou problema a resolver, os personagens se movem, tal qual o mundo real idealizado por Tarantino, se... porém centrado nas atuações do elenco, precisamente em Rick simbolicamente representando Hollywood, é pela sua percepção que entramos nos estúdios e Cliff representando a cidade de Los Angels, é com ele que passeamos pelas ruas de Los Angels. Os demais personagens desempenham papel fundamental dos fragmentos da memória de Tarantino porém com maior distanciamento, Sharon Tate, vivido por Margot Robbie, é um personagem real se firmando como grande atriz de Hollywood, a cena em que ela vai ao cinema para assistir The Wrecking Crew 1968, filme que marca sua entrada em Hollywood com atuação além de sua beleza, e um dos filmes referência para entender melhor Era uma Vez... é de uma beleza, pura, ingênua e tão paupável como realidade, que é tocante. A família Manson e o Spahn Ranch igualmente. A fotografia de Robert Richardson, longa parceria, ajuda a reviver as cores daquela época, e creio que nesse sentido o filme indicado por Tarantino, ou melhor sua lista dos 9 filmes, todos da Paramount (comprada pela Sony), o que mais inspirou a fotografia foi Bob & Carol & Ted & Alice.

E por retratar personagens reais, há sempre as questões polêmicas, e a de Bruce Lee é a mais relevante, confesso que achei a retratação do ator um tanto  pejorativa, e até depreciativa, colocando o astro chinês arrogante de forma gratuita, o embate entre Bruce e Cliff, mostra a hegemonia americana, ocidente x oriente, alias o personagem de Cliff lembra os personagens da literatura noir, um Sam Spade de Dashiell Hammetth ou Phillip Marlowe de Raymond Chandler, escritores que consolidaram o estilo noir, e que trabalharam em muitos roteiros de filmes do gênero. 

No caso de Sharon Tate, é quase um fetiche, em pensar o que atores e atrizes criavam no imaginário dos jovens. A cena em que membros da família Manson são escorraçados por Rick Dalton e ainda assim mantém a admiração pelo ator quando percebe que era ele, traz essa questão a tona. E no caso de Sharon sua beleza chamava atenção, e os filmes parecem sempre buscar isso, nada mais, há referências do filme Don't make Waves, onde Sharon exibe seu corpo. A personagem de Margot Robbie é mais uma homenagem a atriz, e também ao que Hollywood representava naquele momento no imaginário de crianças, jovens e adultos.

Era uma vez...é mais uma prova da capacidade impressionante de Tarantino em criar narrativas, com diálogos que prendem, sem ser monótono ou com pretensa filosofia, basta perceber que as 3h de filme, confesso que nem percebi, ao contrário, ficou o desejo de mais. E ai também reside a maestria do diretor, como iniciar, desenvolver e acabar uma estória, sem se apegar as narrativa clássicas.












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