quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Cléo das 5 as 7 1962


Por Pachá

O filme dessa notável diretora belga encanta pelos diálogos, belíssima fotografia e sobretudo pela desenvoltura e naturalidade da personagem Cléo (Corinne Marchand), uma cantora pop que encara a finitude do ser. O filme abre com cena de uma sessão de tarô onde Cléo tenta aplacar ansiedade de exame médico onde há rumores de grave doença. Na saída da sessão o conforto ao se admirar no espelho “a feiúra é uma espécie de morte, sou bela e portanto estou viva” o que não deixa de conter característico pensamento cartesiano, ou banalização deste. Interessante notar que apenas esta cena é em cores. O restante do filme se desenrola no preto e branco que certamente contribui para atmosfera romantica de uma Paris dourada.

Entre a agenda de cantora pop e futilidades do dia a dia, Cléo vai “matando” o dia até a hora programada com médico para obter laudo. E nesse atribulado dia que se distingue dos outros por conter funestos presságios, Cléo vai questionando sua existência e em momento algum faz deste uma autopiedade ou mesmo queixumes. Em dado momento ela reclama da falta de amor, porém não de forma pedante, revoltosa sim, mas nunca lamuriosa pois todos a mimam mas ninguém a ama. Seu namorado a vê em intervalos de sua conturbada agenda de negócios a ponto de Cléo se questionar a falta que lhe faria caso ela venha morrer, e conclui que não haveria comoção e sim surpresa. Na reunião com compositor e letrista de suas futuras interpretações. Cléo se envaidece e se aborrece com sua condição de mulher objeto enquanto produto comercial uma vez que precisa mostrar pra equipe que não é apenas um rostinho bonito desprovido de talento. E de fato a moça tem talento, mas não está isenta de pensamentos egoístas e da constatação de que a vida segue com ou sem ela. Comparação com Merylin Moore é inevitável, loira, bonita mas, a diva de Varda carrega em sua existência preocupações de curto prazo, a compra de um chapéu de inverno em pleno verão, manutenção da forma física em rápido exercício de alongamento, sempre na companhia de sua secretária Angéle (Dominique Davray).


Apoiado em belíssimas cenas externas de uma Paris pós guerra com ares românticos Varda monta cronologicamente o dia de Cléo até conhecer em despretensioso passeio pelo parque, Antoine (Antoine Bourseiller) um soldado que está de passagem a caminho da Argélia que emociona e comove Cléo com suas historias, assim como ele também se solidariza com a ansiedade da moça. Mas Varda trabalha essa rápida relação deixando expectativas a cargo do espectador, sem cair em meloso drama romântico. Cléo da 5 a 7 é um belo exemplar do nouvelle vague. E é patente homenagem a este movimento, basta reparar na cena em que Cléo juntamente com amiga visita namorado desta, no momento em que ele, projeta o curta "Os Amantes da Ponte McDonald" onde os atores são ninguém menos que Jean-Luc Godard e Anna Karina que na vida real eram casados. 

Consultando IMDB da diretora, Cléo das 5 as 7 é seu segundo longa, o primeiro data de 1955 e entre estes ela realizou alguns documentários e curtas. Em 1965 ela realizou o excelente As duas faces da Felicidade


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