segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Assalto ao trem Pagador

Por Pachá
Os jornais ladearam com ardor esse assalto que preencheu as crônicas policias e mexeu com cotidiano carioca nos anos 60, tanto pela quantia surrupiada (27 milhões de cruzeiros) pelos gatunos, tanto pelo ousadia do feito. Nada do gênero havia sido realizado no Brasil e jornais e a própria policia acreditavam que tal roubo, dado minucioso planejamento, não poderia ser obra de brasileiro. Era coisa de gringo. Reforçando crença da nossa baixa auto estima, no nosso complexo de vira lata como bem se expressou Nelson Rodrigues.

O filme de Roberto Farias também tem esse cuidado, de olhar social, bem falando o filme é mais uma critica social que filme de assalto, este apenas pano de fundo para escancarar a realidade brasileira. Note que a participação negra é esmagadora no qual o protagonista é um negro, Eliezer Gomes no papel de Tião "medonho" algo ainda novo no cinema brasileiro. A gangue liderada por Tião é convencido por Grilo (Reginaldo Farias) a executar audacioso plano bolado por um tal de "engenheiro" de roubo ao trem pagador da Central do Brasil que na ocasião levava mais dinheiro que de costume, além do pagamento mensal, somava-se a este abono de dois meses de salários dos funcionários da rede ferroviária federal. O roteiro de Roberto Farias tem o cuidado de colocar o espectador dentro da cena do crime quando na primeira cena é mostrado os arredores do local onde o bando interceptaram o trem dinamitando os trilhos, na altura do 72km da linha auxiliar que levaria composição a Japeri e Paes Leme. Depois em grande rapidez o bando limpa todo dinheiro, que de acordo com executivos de empresa deveria estar em cofre, mas por comodidade os funcionários encarregados do pagamento o mantiveram fora do cofre, para separação no trajeto, facilitando mais tarde o pagamento.

Com sucesso do roubo o grupo executa a fuga que também consiste em gastos comedidos da bolada, que nenhum participante gaste mais que 10% de suas respectivas partes para não levantar suspeita. Caso contrário o próprio Tião se encarregaria de dar cabo do gastão. A partir desse ponto o filme é carregado com as mazelas cariocas, dos moradores de morro, dos invisíveis pelo Estado muito bem captada nas externas. E pouco a pouco o roteiro vai desvendando os dramas de cada membro do bando, no dilema da pobreza escancarada diante de tanto dinheiro sem poder mudar sua condição de favelado, sem acesso aos bens de consumo que lhes proporcione não só comodidade, mas abrando da dura vida nos morros, uma geladeira, um fogão, uma TV...

Mas como sempre dinheiro no morro não passa despercebido, desperta ganância, desafeto e delação uma questão de tempo. A policia, sem pistas logo percebeu que apenas um golpe de sorte os levaria aos gatunos, que a essa altura já deveriam estar longe. A imprensa como de costume lançava nos jornais as mais estapafúrdias especulações. E ai o roubo tinha até motivações políticas. Grilo autor do pacto, 10% ou morte, foi o primeiro a quebra-lo, quando humilhado por vendedor em concessionária compra luxuoso carro ao mesmo tempo que se engraça por patricinha entediada no casamento. E para manter o alto padrão da ricaça, Grilo se vê obrigado a novo e audacioso plano de roubo a banco arquitetado pelo misterioso engenheiro. Mas Tião logo descobre plano de Grilo que era se livrar do bando. O embate entre Grilo e Tião reside em síntese todo discurso do roteiro e pode ser conferido no trecho abaixo. No todo o filme é um bom exemplo do cinema marginal do final de década de 60, ainda que não tenha sido realizado na boca do lixo e orçamento certamente não era dos menores, e  vale e deve ser conferido pro quem curte o tema.

No blog decada de 50 há incrível material sobre o assalto, pesquisado por um historiador da  UFRJ.


Reginaldo Faria .... Grilo Peru
Grande Otelo .... Cachaça
Eliezer Gomes .... Tião Medonho
Jorge Dória .... delegado
Ruth de Souza .... Judith
Luíza Maranhão .... Zulmira
Miguel Ângelo... Miguel "Gordinho"
Helena Ignez .... Marta
Átila Iório .... Tonho
Miguel Rosenberg .... Edgar
Dirce Migliaccio .... mulher de Edgar
Clementino Kelé .... Lino
Gracinda Freire .... mulher de Miguel (não creditada)



Prêmio Saci 1962 de Melhor ator coadjuvante (Jorge Dória), Melhor atriz coadjuvante (Dirce Migliáccio) e Melhor Roteiro (Roberto Farias)



Prêmio Governador do Estado de São Paulo 1962, Melhor Roteiro (Roberto Farias)

V Festival de Cinema de Curitiba 1962, Melhor atriz coadjuvante (Luíza Maranhão), Revelação (Eliezer Gomes)Troféu Cinelândia 1962, Revelação (Eliezer Gomes)

Festival de Cinema da Bahia 1962, Melhor Filme, Melhor Ator (Eliezer Gomes), Melhor atriz coadjuvante (Luíza Maranhão), Melhor Roteiro (Roberto Farias)

Festival de Lisboa, Portugal, 1963, Prêmio Caravela de Prata
Festival de Arte Negra, Senegal, 1963, Prêmio Especial do Júri
Representou o Brasil no Festival de Veneza de 1962

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