terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Footnote (nota de rodapé)

Por Pachá
Nada tinha visto até então do cinema de Joseph Cedar. Mas me gusta o cinema israelense onde há sempre forte construções de personagens. Em notas de Rodapé esta máxima (em minha percepção) é visivelmente percebida. Os dois personagens centrais, Elizer (Shlomo Bar-Aba) e Uriel (Lior Ashkenazi) pai e filho respectivamente, vive clima de guerra velado. Uma guerra nutrida pelo egoísmo, vaidade e como poetizou certa vez padre Antônio Vieira “Na tragédia da vangloria humana o bem nunca aparece, o mau é sempre figura” e assim são os personagens, abaulados no mais puro narcisismo intelectual. Ambos tem como objeto de vida a pesquisa do Talmude o livro sagrado judeu, e se você tem na Bíblia com Velho e Novo Testamento algo complicado, certamente adotara outra opinião ao se deparar com as ramificações (não sei se aqui cometo garfe no termo ramificações) do Talmude em Mishná (200 d.C) e Guemará (500 d.C), mas para acompanhar o filme basta saber que os livros discutem a lei, ética e moral o que trás certa curiosidade já que os dois personagens atuam na área de pesquisa onde se sabe é inteiramente regida pelo método cientifico e suas convenções, onde a ética e moral nem sempre vem em primeiro plano.

Elizer, o pai, dedicou vida a pesquisa de tais livros, mas nunca obteve reconhecimento ou fama pelo anos debruçados em manuscritos, apenas uma singela nota de rodapé emitida pelo maior (extrapolação minha) estudioso do Talmude seguido do mais silencioso ostracismo. Isso o tornou um homem irascível, prepotente e arrogante intelectualmente. Seu filho Uriel parece viver o sonho do pai, tem reconhecimento, prestigio, fama. Entre os dois há grande cisão que acaba por atingir toda família. Elizer pouco conversa com esposa, nem mesmo dividem a mesma cama, ele está se transformando no homem do subsolo de Dostoievski. Uriel aparente flexibilidade no trato com família, mulher e filhos. Mas o roteiro vai desmontando essa  pretensa flexibilidade de homem de família. Na verdade ele é imagem do pai anos mais moço, só nunca teve confronto com fracasso. Em diálogo com esposa, esta o declara covarde, confirmando, ou mesmo desvendando a escamoteada personalidade de Uriel.

Um telefonema do ministério da cultura a Elizer é o ponto de virada na narrativa, pois vai expor todas as feridas, ainda que não fique claro quais são, e principalmente mostrando que entre pai e filho não há muito diferença, ambos são capazes de tiranizar os que não estão  em seu patamar intelectual. E sobretudo a questão da ética e moral dentro dos cercados científicos.

Tecnicamente o filme é correto, fotografia sem muitos exageros, com predominância diurnas, poucas cenas noturnas, duas ou três no máximo, câmera parada, mas de extremo zelo na postura dramática dos personagens, até mesmo nos coadjuvantes percebe-se preocupação em suas construções. A esposa de Elizer fica como claro exemplo, poucas falas, mas cuidadoso trabalho de expressão corporal e facial. Um filme de Cedar é uma grata surpresa, ao menos em minha percepção.

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