quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Lincoln 2012

Por Pachá
"... já que os brancos acostumaram a ver o negro com armas... quem sabe após a guerra também não possa admitir oficiais negros, daqui a 50 anos um coronel, daqui 100 anos direito a voto..."

Há no inicio do filme, não propriamente com essas palavras, falas iguais as linha acima, e dentro dessa progressão aritmética o discurso é um tanto apropriado já que o lançamento do filme foi adiado para não influenciar a campanha presidencial. Mas ainda sim o lançamento foi muito bem planejado para coincidir com a posse do segundo mandato de Obama. O filme finca lente inimista em importante fato histórico no qual o protagonista é Abraham Lincoln o 16º presidente americano, e o primeiro a ser assassinado. Mas como bem ressaltou o roteirista Tony Kushner há diferença entre drama histórico e História. Quem o diga Marc Ferro que nos anos 60 cunhou o termo cinema-Historia. 

No filme de Spielberg a conotação com a História está mais inclinada para o drama, focado principalmente na figura de Lincoln, um ser humano dotado de poderoso poder de persuasão e sensatez, sobretudo apoiado no dom da retórica, já que era formado em direito. Como fonte de entendimento de ideologias e vozes sociais da época o filme peca imensamente. Vejamos, a 13º emenda que abolia o trabalho escravo afetava muito pouco os ricos estados do norte, industrializados, modernizados com linhas de comércio com ferrenho protecionismo a exemplo da Inglaterra, mas para os estados do Norte, latifundiários e com economia calcada na agricultura do algodão, tabaco viável naquele momento pelo trabalho escravo e principalmente pelo liberalismo  comercial, um golpe fatal (não há aqui defesa do trabalho escravo, ou justificativas para escravidão e sim olhar sob o ponto de vista econômico), este fato não passa despercebido no filme, porém é quase imperceptível, dura alguns parcos segundos quando há a tal negociação com os emissários do norte para negociar o armistício, quando um deles diz que o fim da escravidão vai estagnar não só a economia, mas também as tradições. Há um personagem, que tem a sensatez de se perguntar o que faremos com todos os negros livres, teremos trabalhos e moradias para eles? bem... sabemos o que aconteceu depois...de qualquer forma as vozes do principal beneficiário da 13º emenda não se ouve no filme, são mudos rostos, apenas expectativa de sofrer com cama e comida garantida, ou morrer de fome e frio porém livres, pois abolição não lhes trouxe quase nada  de benefícios sob ótica jurídica. A pesquisa histórica também deu suas escorregadas, tanto foi que o roteirista Tony Kushner pediu desculpas ao povo de Connecticut por ter mudado um pouco  a História.

"Mudamos o voto de dois membros da delegação e criamos novos nomes das pessoas que depositaram as cédulas na urna para não atribuir esse voto a pessoas reais", explicou.

Mas como defesa por qualquer incongruências com os fatos históricos, Spielberg diz não ser historiador e seu filme não tem a pretensão de ser fiel aos fatos. O que não deixa de ser admirável. Tecnicamente o filme é impecável, fotografia em certas cenas no gabinete de Lincoln e no quarto do casal, lembra Byron Lyndon de Kubrick (sei que soa exagerado), pois se olharmos atentamente podemos perceber que há trabalho de luz e não as super lentes desenvolvidas por Kubrick para o projeto Byron, mas não tira o mérito da fotografia. O mesmo pode se dizer dos ângulos, ainda que não tenha nada excepcional, são precisos em captar as tensões em gratificante comunhão com fotografia. Quanto a estrutura narrativa, está dentro do formato dos filmes de relação de poder na esfera política, com homens manipulando em favor de seus grupos.

As interpretações, ou melhor a interpretação é ponto forte do filme. Daniel Day-Lewis no papel de Lincoln está impecável, e não estou me referindo a semelhança com o personagem histórico, mas sim a arte de atuação, expressão facial, corporal, entonação de voz tudo está soberbo no personagem. Há nomes fortes como Tomy Lee Jones, em atuação forte, precisa e sempre correta. Sally Field como primeira dama, em papel histérico, de voz irritante, mas convincente como a chata histórica. E muitos outros, o elenco é extenso.
Ainda dentro do olhar historiografia, é importante ressaltar o que o ato de Lincoln representou para o Brasil, ultimo pais a abolir a escravidão. O Brasil que em 1860 foi citado por economistas (propagandista dos confederados) da América do norte como exemplo, dado que a população escrava era semelhante aos dos estados do Norte, diz que o Brasil estava prosperando pois havia contornando principal ameaça ao sistema escravo ao introduzir mais de 750 mil escravos africanos desde 1831. Joaquim Nabuco um dos mais notórios defensores da abolição, disse que graças a 13º emenda, o Brasil pode por fim a escravidão (1888) sem derramar uma gota de sangue... e esconde na verdade a vitoria dos escravocrata.

Joaquim Nabuco, em 1909 então embaixador em Washington na ocasião do centenário de  Lincoln compara a abolição nos Estados Unidos e no Brasil.. "Ninguém [...] poderia dizer o que teria sido o esforço pela abolição no Brasil se [...] uma nova e poderosa nação houvesse surgido na América [Confederada], tendo por bandeira a manutenção e a expansão da escravidão."

No âmbito geral Lincoln é um filme padrão Spielberg, nem ruim, nem bom.

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