domingo, 5 de agosto de 2012

Cão sem Dono


Por Pachá

Ao ler romance de estreia de Daniel Galera do qual Cão sem dono é baseado, me dei conta que nunca fiz qualquer resenha sobre o cinema de Beto Brant, diretor que muito admiro, desde sua estreia com Os matadores. O cinema de Brant é áspero quando nos coloca defronte a difícil arte de viver. Seus personagens são contraponto entre o existencial e o mal estar do mundo moderno e cínico. 


Ciro (Júlio Andrade) é um jovem com aparente atração pela solidão, e vê nesta o ponto de calma e tranquilidade contra o sentimento de urgência do mundo complexo. Ciro tem única vocação, o ócio. E no seu quotidiano de bebedeira, ressacas e respiração sobra pouco ou nenhum tempo para atividades mais capitalistas, como um emprego, uma carreira para auto sustento, já que mesmo morando sozinho, depende financeiramente do pai para custos básico, aluguel e alimentação. O mundo de Ciro é vazio, tal qual seu apartamento pelado, apenas colchão, fogão e geladeira. Nesse ponto reside certo conformismo do herói, que não se lamenta pela monumental falta de disposição para empreendimentos do ser vitorioso. 

Mas o mundo Ciro sai da normalidade quando entra em cena cão de rua que o segue até apartamento. O cão faz, ainda que de maneira sombria, Ciro se sentir responsável por algo, mesmo que um cão, já que Crio se sente incapaz de cuidar de si mesmo, uma mostra da liberdade ante ao absurdo de viver. Bom frisar que esse desenrolar não é dado de forma linear, pois na primeira cena temos Ciro e Marcela (Tainá Muller) no pelado apartamento. A historia é desenvolvida em fragmentos de pensamentos do protagonista. 


Marcela numa surpresa de interpretação de Tainá Muller, tal qual Paulo Miklos em o Invasor, cria essa atmosfera de abandono de seres das metrópoles, ela profissional bem remunerada do ramo da moda, mas com planos a longo prazo, cria desconforto com Crio que não tem plano algum para curto ou longo prazo, ele apenas respira e vive e tenta da sua maneira não deixar Marcela transpor sua noção de liberdade pautada na solidão sem apego emocional, mas é claro que ele falha, ainda que demostrado de forma sutil pelo roteiro. 


A estrutura narrativa de cão sem dono, que foi roteirizada por Marçal Aquino, guarda em sua verve estilo de filmes anteriores de Brant, Crime delicado por exemplo e o Invasor, onde há grande preocupação com interação dos personagens e as modificações desencadeadas dessa interação, embora cada um guarde suas particularidades, tendo como caracteristica o peso existencial de personagens entre abandono e solidão como forma de existência, com intensa carga cotidiana.


Nenhum comentário:

Postar um comentário