"Não acredite em nada, não importa onde o tenha lido ou quem o tenha dito, nem mesmo se eu disse, a não ser que isso acorde com sua própria razão e seu bom senso"
Buda
Em época de tons de cinza e outras atrocidade que tem
no sexo o grande attrayant para alcançar leitoras e leitores, o que
dizer de um livro escrito em 1949 que retrata uma Nova Iorque da década de 20 e
30 onde a fruição é o remédio e antídoto contra a realidade opressora do
pós-guerra? Assim é sexus volume primeiro da trilogia crucificação encarnada,
onde entre as dificuldades do dia-a-dia que nos faz sujeito e parte integrante
dessa grande engrenagem que é o capitalismo, e no outro lado, nossas pulsões,
anseio de dar sentido a algo que não tem sentido, pois tudo não passa de
emoção, desejo e necessidade, assim é Henry que toca sua ignóbil vida
onde os objetivos primeiros são, fuder e um bom e farto prato de comida, não
necessariamente nessa ordem Henry vai matando seus dias entre as
picuinhas de um trabalho que nada serve, se não prover ao final do mês o
subsidio para sua vocação, escrever, mas ele ainda vive sob a duvida de sua
veia literária. Nesse ínterim ele conhece Mona uma táxi girl em salão de dança.
Entre eles nasce tórrida paixão. A partir desse ponto o livro galga nas
loucas aventuras sexuais de Henry e Mona, transa dentro do táxi, na rua, em
terrenos baldios. Narradas sempre com certa crueza de detalhes, mas assim é o
animal homem em suas necessidades básicas, comer e acasalar, sem frescuras, ou
pudor, ou moralismo.
Henry Miller que encarna sua crucificação nessa
trilogia que mistura ficção com autobiografia remonta passado duma Nova Iorque
durante os anos loucos, onde a vida era tragada como se não houvesse amanhã.
Tal comportamento certamente não era exclusividade de Sr. Miller, o mundo vivia
nesse frenesi dado as calamidades promovidas pela I Guerra Mundial. Miller vai
dissecando e questionando a vida, arte e as relações dos seres humanos ao seu
redor. Seus debates intelectuais com Sr. Kronski são intensos, numa clara
influencia de Dostoievski. Há determinada passagem onde em viagem de
automóvel, surge caloroso debate das motivações do artista.
"... a arte não é espetáculo para solista; é uma sinfonia no escuro com milhões de participantes e milhões de ouvintes. A apreciação de uma bela idéia nada é comparada à alegria de dar-lhe uma expressão..."
Passagens como esta
a que o livro está repleta, algumas com clara mensagem de auto ajuda, mas na
época tal gênero não existia, põe por terra a classificação do livro como
imoral, erótico, pornográfico. Ai volto a citar Mannara para quem a diferença
entre pornográfico e erótico, reside tão somente no poder aquisitivo de quem
consome tal gênero.
O estilo de Miller é simples, em claro esforço de se
escrever como se fala, inclusive isto é mencionado pelo autor na busca pela sua
voz de escritor, de saber transpor para o papel pensamentos e ações de vida
boemia. Os personagens, fictícios ou reais, são bem construídos, muito embora é
possível notar certo pedantismo, pois todos amam Henry a despeito das ofensas
que ele possa lhes lançar, pois suas verdades sempre agem como algo libertador,
constrangedor, humilhante ate, mas libertador. A trilogia da crucificação encarnada é seguida por plexus II e nexus III, escritos quando autor gozava de considerável fama no universo literário.
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