domingo, 17 de agosto de 2014

The Rover - a Caçada

Por Pachá
“ Temo que o espirito esteja se transformando em coisa supérflua” a celebre frase de Paul Valéry a respeito da violência como forma das relações humanas, bem que poderia resumir o novo filme de David Michôd - The Rover a Caçada - mas neste a violência nada tem de passional e é fruto de causas objetivas, ou pelo menos é o que sugere o roteiro. Uma crise econômica, ou mesmo um desastre natural, não sabemos, tudo que temos é a conseqüência, e seja la o que for as causas, mergulha o interior da vasta Austrália numa terra sem Estado, sem lei onde a vida vale quase nada, embora roteiro trate com ambiguidade esta questão.

Um motorista (Guy Pearce) estaciona seu sedan em bar a beira de estrada que corta deserto australiano. Um bando, fugindo de assalto que não deu muito certo, capota com carro nas proximidades do sedan, sem pestanejar eles roubam o carro. E dai sai o mote do filme. E quando do banal se extrai algo excepcional ficamos com a justa percepção de estar diante de boa obra. A trama do sujeito sem nome para recuperar seu carro tem desenrolar lento, mas contundente nas imagens e diálogos. E se o roteiro não vê relevância em nos contar o que levou o país a tal situação, o mesmo não pode se dizer das motivações do sujeito que esta determinado a recuperar seu carro. E nesse sentido o roteiro sutilmente vai nos colocando em um mundo caótico, onde sobreviver significa atire primeiro, seja caçador, jamais a caça. O protagonista de Michôd vive os últimos dez anos sob esta rígida filosofia. 

A violência posta a prova, nada tem de gratuita, e retomando frase de Paul Valéry, citada ao inicio do texto, ela faz parte da mesma moeda, cuja outra face é o ímpeto (espirito) de construir. Nossa espécie persiste até os dias de hoje porque precisou destruir para construir, sobreviver, evoluir e tudo que cruzou o caminho do progresso do homo sapiens ou foi destruído ou incorporado, e o fato de que não conseguimos conviver com nosso própria espécie sem por vezes dar vazão a nossa pulsão de morte levando o espirito ao ápice do supérfluo, quando nada mais se tem a perder. E ai, qualquer coisa que crie os lastros para se manter a vida (convívio em sociedade) é válido, e nesse aspecto o filme de Michôd é feliz em criar vínculos que nos faz diferenciar realidade da ficção, do contrário tudo é permitido.

O road movie tem na interpretação de Guy Pearce o motor propulsor de reflexões a cerca do homem em sociedade. O personagem é introspectivo, quase não fala, seu ódio parece banal, "quem nos dias de hoje da valor a esse tipo de coisa?" retruca personagens quando "interrogada" sobre paradeiro do sedan e os homens que o roubaram. Pelo caminho encontra irmão de um dos homens que roubaram seu carro. Rey (Robert Pattison), está ferido, é auxiliado pelo homem do sedan, que o leva a médico. Sua intenção é clara, ajudar o ferido para que este o leve aos homens que roubaram seu carro. Entre os dois parece surgir algum elo de amizade, ainda que tênue, pois o sujeito esta determinado a recuperar o carro, e pelo meio do caminho os dois vão deixando rastro de mortes.

Um aspecto interessante é como o roteiro vai dando os motivos pelos quais o homem parte nessa empreitada. Tudo é dito pelo protagonista em poucas palavras, secas e áridas como deserto australiano. A fotografia de Natasha Braier capta de forma convivente; dimensão, calor, cor e vazio criando 

Em tempos de banalização das relações, sem muitos questionamentos a cerca do futuro, o filme de Michôd abre espaço para muitas discussões. E ao sair do cinema, a sessão de grande soco na "boca" do estômago, para qual a dor é coadjuvante, onde a pergunta porquê, faz toda diferença quando não há respostas convincentes nos lembra fragilidade da vida. Em seu primeiro filme, Reino Animal, Michôd abordou tema com grande propriedade, e o repetiu igualmente convincente.








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