quarta-feira, 11 de maio de 2011

O cozinheiro, o ladrão, a esposa e o amante

Por Pachá
Comer é um instinto puramente animal que nós homens sapiens escamoteamos ao transformar tal ato em arte. Para o diretor britânico Peter Greenway esse instinto é básico e que em sua visão não há muito diferença entre animal racional, homem, e animal irracional quando o assunto é se alimentar. Isso é mostrado logo na primeira cena de O cozinheiro... Onde cães de diferentes raças se deleitam com restos de carnes e logo em seguida a câmera faz seu passeio lateral, no característico estilo de verticalização dos planos de filmagem de Greenway, para mostrar cenário e personagens, e logo nos deparamos com Albert Spica o tal ladrão do titulo que tortura um cozinheiro. Particularmente acho cansativo esse movimento de câmera, travelling, que torna os planos em palcos de teatro.

Ao prosseguir em seu passeio, a câmera de Greenway vai nos colocando no ambiente da narrativa onde a gula, ou pelo menos o prazer de comer, desencadeia outros pecados; luxuria, preguiça, vaidade. E parece ser este o cerne da questão abordado por Greenway a gula como o pior dos pecados, pois dela aflora todos os outros.

Os cenários que são outra característica de Greenway vejam, por exemplo, Nightwatch, A ultima tempestade, este é tratado ao esmero da sofisticação entre o clássico e o romântico, com cores que saltam os olhos a ponto de quase sentirmos a textura do que esta em cena. No caso de O cozinheiro... Todo o tempo é feito uma referencia a um quadro, ao que me parece ser de algum pintor do sec. XVI, onde é mostrado uma mesa de jantar, o qual Greenway tentar retratar seja no figurino, que é assinado por Jean Gaultier, tanto no que estar por trás deste cenário do quadro renascentista, no caso a cozinha.

É possível ver os pecados em cada personagem do titulo, o cozinheiro, Richard tem o pecado da vaidade ao ser considerado o grande chef e, portanto soberano em sua posição o que nos leva a outro característico comportamento renascentista no qual a cozinheira tinha relevante poder sociocultural durante os banquetes, influenciando a política e até a igreja. O ladrão Albert, a gula e todos os outros pecados, a esposa, Georgina cabe a luxuria dado sua fome sexual e ao amante, Michael cabe a gula intelectual bem como a cobiça. A alegoria pecaminosa de Greenway é fundamentada por uma fotografia de cores poderosas quanto belas, mesmo quando há o grotesco, caso em que os amantes completamente nus são obrigados a se esconderem em um caminhão carregado de carnes em estado de putrefação, tendo nesta mais uma correlação entre irracional e racional.

E por fim, a mensagem final de que a vingança é tão urgente quanto a fome. E Georgina parte para vingar o assassinato de Michael e mais uma vez as imagens poderosas da narrativa de Greenway ainda que grotesca são amparadas pelos conceitos da natureza morta e sua visão enciclopédica da história da arte.

O cozinheiro, o ladrão sua esposa e o amante é sem sombra de dúvidas um filme perturbador cujas imagens nos perseguem por dias.

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